Damião de Goes, um Humanista de Alenquer

Damião de Goes nasceu em Alenquer, a 2 de fevereiro de 1502. Filho de Ruy Dias de Goes e de Isabel Gomez de Limi, foi batizado na Igreja de Santa Maria da Várzea.
Órfão de pai muito novo, e sendo a sua família ilustre, é admitido como pajem na corte de D. Manuel I, onde recebeu uma esmerada educação.
Em 1523, com 21 anos é nomeado escrivão da feitoria de Antuérpia na Flandres pelo Rei D. João III. Mais tarde, no reinado do mesmo monarca, foi embaixador de Portugal a diversos estados da Europa.
Nas diversas viagens em representação oficial do Rei trava amizade com grandes humanistas e críticos da Igreja de Roma, tais como Martinho Lutero, Filippe Melanchton, Erasmo de Roterdão, entre outros.
Frequenta as Universidades de Pádua em Itália e Lovaina na Flandres.
A sua amizade com os Humanistas europeus é vista com desconfiança pelos eclesiásticos portugueses e o Rei D. João III começa a pressioná-lo para regressar a Portugal.
Volta ao país em 1545 para ser mestre do príncipe João. Mas nesse mesmo ano é-lhe movido o primeiro processo no Tribunal da Inquisição sob acusação de heterodoxia, na sequência de denúncias do padre Simão Rodrigues. Beneficiando da proteção de D. João III, os processos foram arquivados.
A 3 de junho de 1548 é nomeado guarda-mor interino da Torre do Tombo, acabando por permanecer no cargo até 1571, ano em que é preso pelo Santo Ofício, resultado de inúmeras denúncias de heresia.
Entre os seus delatores encontravam-se elementos do clero, como o frade jesuíta Simão Rodrigues, da nobreza como Pedro de Andrade Caminha, e mesmo da própria família, casos do genro Luís de Castro e a sobrinha Catarina de Góis.
Após um longo e penoso processo de julgamento, ouviria em 1572 a sua sentença por parte dos inquisidores: confisco de todos os seus bens e cárcere penitencial perpétuo.
Em dezembro desse mesmo ano, era levado para o mosteiro da Batalha para o cumprimento da pena. Envelhecido, pobre e doente é libertado por ordem do Rei, provavelmente em finais de 1573, e recolhe à sua casa de Alenquer.
A 30 de janeiro de 1574, poucos dias de completar 72 anos, é encontrado morto na sua habitação em circunstâncias nunca totalmente apuradas.
Foi sepultado na Igreja de Santa Maria da Várzea, no túmulo que ele próprio mandara erguer em 1560 e no qual escrevera o seu epitáfio em latim. Um fim triste e indigno para um dos maiores vultos da Europa Renascentista, cuja obra e pensamento continua a fascinar académicos e estudiosos um pouco por todo o mundo.
Além de diplomata, Damião de Góis notabilizou-se como cronista, sendo da sua autoria a Crónica do Felicíssimo Rei D. Manuel, a Crónica do Príncipe João ou ‘Urbis Olisiponis descriptio’ (Descrição da Cidade de Lisboa), que ainda hoje permanece uma obra de referência para quem quer estudar a Lisboa renascentista.
Foi ainda músico e compositor, historiador e colecionador de arte. Mas talvez o seu maior legado seja o seu pensamento humanista, de tolerância e de respeito pelo outro, temas hoje tão atuais como na Europa de 1500.
Em 2017, após profundas obras de recuperação da Igreja de Santa Maria da Várzea, local onde o humanista foi batizado e sepultado, foi inaugurado o Museu Damião de Góis e das Vitimas da Inquisição em sua homenagem.
Durante o mês de fevereiro de cada ano realizam-se as comemorações do aniversário de Damião de Góis, através do ‘Alenquer, Terra de Damião de Góis’, onde são promovidas iniciativas para relembrar o legado do humanista alenquerense.
Bibliografia: Guapo, António Rodrigues, …[et al.], (2000) Damião de Goes: uma antologia de textos biográficos. Câmara Municipal de Alenquer
Links com interesse:
https://www.facebook.com/profile.php?id=100063496116351
https://antt.dglab.gov.pt/exposicoes-virtuais-2/damiao-de-gois-um-humanista-na-torre-do-tombo/
O Projeto ‘Da Biblioteca para o Mundo’ é uma parceria entre a Comunidade Intermunicipal do Oeste e a Rede Intermunicipal de Bibliotecas do Oeste (RIBO) com o propósito de descobrir ou revisitar figuras do município que gravaram o seu nome nos livros.
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